LLC
É recorrente na Câmara dos Deputados que a urgência seja acolhida quase sem resistência, mas o salto decisivo ocorre na votação de mérito, quando partidos ajustam acordos e lideranças pressionam parlamentares a confirmar ou reverter seus posicionamentos.
No caso do PLP 177/2023, o Requerimento nº 1691/2025 obteve um placar expressivo de aprovação da urgência — até mesmo estados diretamente penalizados na redistribuição, como Alagoas e Piauí, registraram 100 % de votos “Sim”.
Ao avançar para o mérito, esperava-se maior hesitação: se, por um lado, estados como Bahia e Pernambuco demonstraram alguma retração (–13 pp e +4 pp em “Sim”, respectivamente), a maioria das bancadas manteve ou ampliou seu apoio, transformando ausências em votos favoráveis e reforçando o fenômeno de coesão institucional. Somente o Rio Grande do Sul sustentou coerência estadualista, elevando de 71 % para 77 % o percentual de rejeição ao texto. Essa dinâmica — urgência acelerada seguida de confirmação quase plena no mérito — expõe as engrenagens de barganha e disciplina partidária que permeiam o processo legislativo.
O PLP 177/2023 propõe redistribuir as 513 cadeiras da Câmara dos Deputados, retirando lugares de sete estados e realocando-os para outros, com base nos dados do Censo de 2022. A mudança visa dar cumprimento à determinação do Supremo Tribunal Federal na ADO 38, que reconheceu a omissão legislativa quanto à atualização da representação populacional da Câmara¹.
Estado | % “Sim” Urgência |
AL | 100 % |
BA | 90 % |
PB | 83 % |
PE | 72 % |
PI | 100 % |
RJ | 76 % |
RS | 29 % |
Com exceção do Rio Grande do Sul — e um voto isolado na Bahia — as bancadas afetadas aprovaram a urgência, acelerando a tramitação de um projeto que implicaria perda de representatividade para seus próprios estados.
Estado | Urgência → Mérito | Variação em pp |
AL | 100 % → 100 % | 0 |
BA | 90 % → 77 % | –13 |
PB | 83 % → 92 % | +9 |
PE | 72 % → 76 % | +4 |
PI | 100 % → 100 % | 0 |
RJ | 76 % → 78 % | +2 |
RS | 29 % → 23 % | –6 |
Apesar de pequenas variações — como a conversão de ausências em votos “Sim” — seis dos sete estados mantiveram ou ampliaram seu apoio à proposta no mérito. Somente o Rio Grande do Sul reforçou a rejeição.
A aprovação do PLP 177/2023, ainda que por margem relativamente estreita (270 votos favoráveis contra 207 contrários), representa um esforço relevante da Câmara dos Deputados em cumprir sua função constitucional. Trata-se de uma resposta legislativa à omissão histórica reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal na ADO 38¹, e um passo necessário para atualizar o sistema representativo brasileiro com base nos dados do Censo de 2022.
Embora algumas bancadas tenham perdido cadeiras, a aprovação do texto reflete também uma postura institucional madura: conciliar os princípios do pacto federativo com a proporcionalidade populacional, mesmo diante de resistências locais. A exceção do Rio Grande do Sul, que manteve uma linha estadualista coerente, contrasta com a maioria das demais bancadas que priorizaram o cumprimento da norma constitucional e a preservação da legitimidade da Câmara como Poder.
Essa decisão legislativa, mesmo com tensões regionais, reforça a imagem do Parlamento como instituição capaz de absorver desafios federativos e dar respostas políticas à altura das determinações constitucionais.
¹ Nota explicativa: A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADO) nº 38, julgada pelo STF, reconheceu que o Congresso Nacional descumpriu sua obrigação de atualizar o número de deputados por estado com base em dados populacionais. A Corte fixou um prazo para o Legislativo legislar sobre o tema, sob pena de intervenção judicial direta.
Leonardo Loiola Cavalcanti é advogado, assessor legislativo na Câmara dos Deputados e consultor em análise político-legislativa.