Desafio aceito: advogado criminalista e assessor legislativo responde a Sóstenes (PL) — onde a CF autoriza “reduzir penas” já aplicadas?

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Desafio aceito: advogado criminalista e assessor legislativo responde a Sóstenes (PL) — onde a CF autoriza “reduzir penas” já aplicadas?

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O advogado criminalista e assessor parlamentar na área legislativa, Leonardo Loiola Cavalcanti, aceitou o desafio proposto pelo líder do PL na Câmara dos Deputados, que perguntou: “onde, na Constituição Federal, está escrito que o Legislativo pode ‘reduzir penas’ já aplicadas a condenados?”

 

O desafio foi registrado pelo portal Metrópoles, em matéria publicada em 19/9/2025, na qual o deputado Sóstenes Cavalcante afirmou que a redução de penas seria “atribuição exclusiva do Judiciário” e lançou o convite para que se apontasse o fundamento constitucional. Leia a matéria: “Redução de pena é atribuição exclusiva do Judiciário, diz líder do PL” — Metrópoles.

Lanço um desafio: que qualquer legislador ou jurista me aponte onde, na Constituição Federal, está escrito que o Legislativo pode ‘reduzir penas’ já aplicadas a condenados? Isso não existe! A redução de pena é atribuição exclusiva do Poder Judiciário.” — Sóstenes Cavalcante, em publicação citada pelo Metrópoles.

 

Desafio aceito

 

A Constituição manda que a lei penal mais benéfica retroaja (art. 5º, XL). Logo, quando o Congresso aprova uma lei geral e impessoal que suaviza a moldura penal em abstrato (faixas de pena, causas de diminuição, critérios de substituição, regime inicial etc.), essa lei alcança também condenações já transitadas em julgado. Quem aplica ao caso concreto é o Juízo da Execução, como pacifica a Súmula 611 do STF.

 

Onde está isso na Constituição (e na lei)

 

  • CF, art. 5º, XL: “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”.
  • Código Penal, 2º, parágrafo único: a lei posterior mais favorável aplica-se ao fato anterior, ainda que decidido por sentença transitada em julgado.
  • Súmula 611 do STF: transitada em julgado a condenação, compete ao Juízo da Execução aplicar a lei penal mais benigna.

 

Em outras palavras: o Legislativo conforma a norma penal em abstrato; o Judiciário aplica essa norma aos casos concretos — inclusive para ajustar penas já fixadas, sempre que a nova lei for mais favorável.

 

O que o Congresso pode (e o que não pode)

 

  • Pode: aprovar leis gerais e impessoais que reduzam a severidade penal em abstrato (ex.: criar causa especial de diminuição de 1/3 para hipóteses sem violência ou grave ameaça; ajustar mínimos/máximos de tipos penais; ampliar elegibilidade de substituição do 44 do CP). Pela regra constitucional, isso retroage e incide na execução.

 

  • Não pode: “recalcular” penas caso a caso por lei, nem editar norma ad personam (“para os réus de 8/1”). Isso violaria a separação de poderes e a impessoalidade. A reindividualização concreta da pena é do Judiciário.

 

Não confunda: anistia ≠ lex mitior ≠ indulto

 

  • Anistia: competência do Congresso (CF, 48, VIII). Extingue a punibilidade; é política criminal explícita.
  • Lex mitior (lei mais benigna): também nasce de lei do Congresso, mas não extingue automaticamente a punibilidade; suaviza a moldura penal e retroage por força da Constituição.
  • Indulto/comutação: competência exclusiva do Presidente da República (CF, 84, XII), por decreto.

 

Como isso aparece na prática (exemplo numérico simples)

 

  • Pena fixada: 4 anos e 6 meses, regime semiaberto.
  • Nova lei (geral e impessoal) cria causa de diminuição de 1/3 para condutas sem violência ou grave ameaça em contexto específico (p. ex., manifestação coletiva).
  • Juízo da execução aplica a lei mais benéfica: 4a6m → 3a0m (redução de 1/3 = 1a6m).
  • Com 3 anos, pode haver regime aberto e até substituição por restritivas de direitos (se presentes os requisitos do art. 44 do CP).

 

Nota: não houve revisão da sentença pelo Legislativo; houve aplicação judicial de uma lei mais favorável criada pelo Congresso, como determina a Constituição.

 

E quanto ao 8/1?

 

Se a intenção política é diferenciar condutas não violentas das violentas — sem anistiar —, o caminho juridicamente sólido é a lei geral e impessoal (lex mitior). Exemplo: criar causa de diminuição de 1/3 para crimes sem violência ou grave ameaça à pessoa, com critérios objetivos de exclusão (hediondos, terrorismo, tortura, tráfico, emprego efetivo de arma de fogo, dano qualificado a bens/serviços essenciais etc.). Essa lei valeria para qualquer caso, passado ou futuro, e seria aplicada pelo Juízo da Execução, caso a caso.

 

Conclusão

 

O desafio parte de um falso dilema. Não é o Legislativo quem “reduz a pena” no processo individual; ele define a moldura penal. A Constituição garante a retroatividade benigna e atribui ao Juízo da Execução a tarefa de ajustar as penas já aplicadas quando a nova lei é mais favorável. É exatamente assim que funciona o Estado de Direito.

 

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